domingo, 23 de fevereiro de 2025

Família Rampanelli - Capítulo XX - 5ª Parte - Primeiros tempos na Colônia Dona Isabel - Vencendo a floresta virgem.

 

Vencendo a floresta virgem

                        A eliminação da floresta sempre foi vista como uma vitória e uma conquista do homem, um sinal de progresso e prosperidade. Era o primeiro obstáculo a ser vencido, estava impresso na mente do colono imigrante, a necessidade de dizimá-la. Na propaganda para atrair imigrantes para a colonização do sul do Brasil, havia a promessa da facilidade de adquirir um lote agrícola e isso era muito atrativo para os imigrantes europeus.

                        Porém tamanha deve ter sido a surpresa desses imigrantes, principalmente para os pioneiros da imigração, ao aqui chegarem e se depararem com áreas cobertas por densas florestas, eram ao mesmo tempo imponentes, majestosas, mas, também, perigosas e assustadoras, provocavam nos imigrantes um misto de estranhamento e encantamento, pois, a floresta era um ambiente físico novo para os colonos, devem ter se  perguntado sobre como proceder para domar essa natureza virgem e desenvolver a agricultura.

                        Os imigrantes italianos/tiroleses estavam sós, com seus medos, abandonados no meio da floresta virgem. Entre os relatos de imigrantes, está o do padre italiano Luigi Marzano, escrito em 1904 ao se referir à colonização italiana no sul do Brasil:

            Para quem nunca pôs os pés em tais florestas, torna-se impossível fazer-se uma ideia do grandioso conjunto e severo espetáculo que elas oferecem à vista do visitante. [...] A floresta é tão espessa que torna impossível a visão além dos vinte passos”. [...] (RADIM e outro, 2018, apud MARZANO, 1985, p.118).

Da Agrura à fartura - A mesa não era farta para o imigrante pioneiro

                        O modo de vida dos primeiros colonizadores era feito de muitas privações. Como alimento, naqueles primeiros tempos, o café da manhã era composto de mate com algumas bolachas secas e duras, e o almoço, de sopa de arroz com feijão, o que era repetido no jantar.

                        A simbologia do imigrante italiano como ostentador de uma mesa farta, não era algo que estivesse na simbologia do pioneiro. A sua imagem é a do homem sob  privação. Viviam com poucos recursos na Áustria-Itália e aqui também na condição de imigrantes recém-chegados.

            O imigrante pioneiro, apesar da forma penosa e dura de viver nos primeiros tempos nas colônias foi se adaptando a estas condições adversas, e à medida que vai se sintonizando com o ambiente, transforma a sua área de terras coberta de mata virgem em roça nova. Esta conquista se deu com os parcos recursos disponíveis, utilizando o ferro do machado e o fogo das queimadas, esse sistema de coivara aprendeu com os nativos brasileiros, que consistia na derrubada das árvores e depois de secos, os galhos mais finos eram queimados para oferecer o espaço necessário para o plantio, os troncos mais grossos eram deixados para apodrecer e virar adubo. Por entre os troncos carbonizados plantava-se primeiro o feijão, depois o milho e demais produtos da terra.

Sistema Coivara: Derrubada da mata, corte dos galhos mais finas e queima. Os toncos mais grossos eram deixadas para apodrecer. Em seguida vinha o plantio, principalmente de milho e feijão. Fonte: Acervo CEOM/Unochapecó.

            A falta de experiência acarretava várias decepções quanto à esperada colheita, que dava ao colono somente o indispensável à subsistência da sua família, com o tempo as suas colheitas melhoraram e o excedente já era vendido ou trocado por outros produtos que lhe faziam falta, como: café, mate, sal, arroz e açúcar, etc... Esse processo ainda era realizado localmente, pois a falta de estradas e o estado lamentável das picadas impediam o escoamento de sua produção.

                        Os efeitos do processo de colonização alteraram gradativamente à região por meio da ação humana. A derrubada da floresta transformando o espaço em lavoura foi uma necessidade para a sobrevivência dos colonos, mas também foram vistos como motivo de orgulho pelo imigrante que graças ao seu trabalho soube derrubar a mata cerrada e “afugentar os animais ferozes”, não satisfeitos foram construindo casas, estradas, escolas e erguendo igrejas, enfim construíram cidades.

                        Estes pioneiros imigrantes tinham como ideal poder dar uma vida melhor aos seus filhos, isso significava dar-lhes terra para trabalhar, consolidando uma cultura basicamente agrícola, que contribuiu para acelerar a ocupação de novas áreas coloniais.

                        Com a construção das casas de comércio o imigrante consegue vender os seus produtos e adquirir outros. O colono coloca seus produtos numa carreta, puxada geralmente por bois, burros ou cavalos e leva seus produtos para a venda. Nesse comércio ressaltamos a importância do cavalo e da carreta de bois. Era rico o colono que tinha em sua terra, porcos no chiqueiro, destes tiravam vários produtos, principalmente a carne e a banha, e no mínimo uma vaquinha de leite.        

      

Registro fotográfico da primeira vaca de leite comprada pelo família Soccol. Na imagem: Arcângelo e Júlia Soccol e as crianças, Lourdes, Cerci, Edir e Valmor. Acervo: Solange Maria Soccol.

            A caça e a pesca também foram muito importantes para a sobrevivência dos imigrantes, principalmente nos primeiros tempos, depois foram incorporadas outras atividades como: a construção da casa, a lavoura, aos poucos começaram a criar seus animais domésticos, porcos,  galinhas e  vacas leiteiras, além de coletas que faziam de frutos da região, a carne de caça também fazia parte do cardápio e assim, fome não passavam, ao contrário do que acontecia na terra de origem naquela época.

            Após os anos iniciais, os imigrantes já familiarizados com o novo ambiente, transformam a densa floresta em cinzas, destas surgem às lavouras que lhes darão muitos lucros, já entram na floresta para caçar e saem dela com grande habilidade.

            As dificuldades maiores ficaram ligadas ao processo de dominação do solo, pouco conhecido, à precariedade das ferramentas para o desmatamento e plantio. Após o desmatamento e a limpeza do solo e plantio, uma forte seca no ano de 1877, dizimou quase por completo a plantação, sendo necessário esperar pelo novo plantio. O clima ainda não era a maior preocupação dos colonos, mas, a falta de um mercado consumidor dos centros urbanos maiores e a ausência de estradas e meios de transportes que dificultavam muito o escoamento da produção. Mas mesmo assim, as mesas ficaram fartas, a fome não assustava mais ninguém. Cada um era senhor de si mesmo. Somente durante o  processo de  colonização é que a comida farta se transformará num símbolo da ítalo brasilidade.

A construção de estradas

            A estrada mais importante para as colônias de Dona Isabel (Bento Gonçalves) e Conde d’Eu (Garibaldi) e posteriormente também para Alfredo Chaves (Veranopólis), era a estrada Geral, mais tarde denominada de Estrada Buarque de Macedo.

            Os imigrantes no ínicio da colonização eram utilizados na abertura e manutenção dessas estradas, na construção de barracões, na abertura de picadas, em troca o dinheiro recebido era utilizado para pagar as dívidas existentes com a compra dos lotes e também para a manutenção das famílias dos colonos nos primórdios da colonização.

            Este trabalho remunerado, era realizado por revezamento, ou seja, 15 dias por mês de trabalhos para a direção da Colônia em construção de estradas e os demais 15 dias os trabalhos dos colonos era realizados em suas propriedades, sem remuneração, nesse caso.

                     Abertura e construção de estradas. Fonte: Museu Histórico Casa do Imigrante – Bento Gonçalves/RS.

            Praticamente todas as famílias dos primeiros colonos imigrantes italianos/tiroleses foram obrigados, por necessidade de sobrevivência familiar, a trabalharem na construção de estradas. Para a família de Giuseppe Rampanelli não foi diferente, mas já estavam acostumados a esse exílio forçado, pois na Áustria  ou na Itália era comum, em determinadas épocas do ano, principalmente no inverno, aos chefes de família e filhos mais velhos a buscarem trabalho em outros países europeus, principalmente na França.

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