O falecimento do Padre João Menegotto
Sobre o falecimento do Pe. João Menegotto em 11 de fevereiro de 1902, quem nos deixa o testemunho de como se deu seu passamento é Júlio Lorenzoni:
“Homem gordo, atarracado, quando estava
em casa não sabia descansar nem meia hora, e, justamente no dia anterior, havia
ido celebrar a santa missa no número trinta e três da Linha Palmeiro,
localidade conhecida por Barracão. Era um dia muito quente, no auge do verão, e
ele, a uma certa hora, sentiu-se mal: em seguida foi transportado a uma casa
vizinha, mas, infelizmente, pouco ou nada puderam fazer. Ao anoitecer daquele
mesmo dia (dez de fevereiro) trouxeram-no em carroça para a Vila, chegando aqui
à noite. [...] no dia seguinte veio a falecer. Sua morte causou geral
consternação, porque era um sacerdote muito amado e querido pelos seus
paroquianos. Aos funerais do ótimo
vigário, acorreram os colonos de todas as Linhas, amigos e conhecidos também de
municípios vizinhos”.
Nos anos de 1902, 1906, 1908 e 1911, assumem como vigários da Paróquia de Santo Antônio de Bento Gonçalves, Padre César Sciullo, Padre Ângelo Donato, Padre Francisco Saverio Acierno e Henrique Domênico Poggi, respectivamente nessa ordem. Júlio Lorenzoni (1975) afirma que o Padre Sciullo, depois de quatro anos como vigário, abandonava a batina e casava com uma filha do comerciante Luís Allegretti. Da mesma forma que o Padre Sciullo, o Padre Acierno tirava a batina e casava com a jovem Ana Salton.
Já
no raiar do ano de 1912, a parte religiosa do município fica ao encargo do
esforçado e zeloso sacerdote Padre Henrique Poggi, ótimo e virtuoso vigário, um
apóstolo da religião, amado e estimado por todos.
Em
1914 começa a construção da casa canônica, concluída em 1918 e ampliada em
1923.
Em 1922 a Igreja
Matriz de Santo Antônio começa a ser ampliada, sendo concluída em 1923, tomando o formato atual. Em 1933 foi
construída a torre da Igreja. Acervo: Itacyr Luiz Giacomello
A
Escola na Capela (nas linhas)
Como
já vimos em capítulo anterior, os imigrantes tiroleses trentinos, chegaram no
Brasil na sua maioria alfabetizados, ao contrário dos imigrantes italianos que
formavam maioria de analfabetos. Por essa razão os imigrantes italianos eram
vistos como contrários à escola, dando menos importância para ela do que ao
trabalho. Na realidade o que ele não
admitia era uma escola que impedisse o trabalho ou o afastasse dele,
principalmente em épocas de plantio e de colheita.
Queriam
uma escola voltada para a vida, para os negócios, que ensinasse a ler, escrever
e contar, portanto o estudo devia atender às exigências do trabalho. Para o
colono imigrante analfabeto, o menos que seus filhos aprendessem já era muito,
o suficiente para a vida, olhavam sempre para aquilo que conseguiam acumular.
Diziam tanto o agricultor, quanto o
comerciante e o artesão: “Mi son omo de pràtica e nó de gramática” (eu sou
homem de prática e não de gramática). Também se apegar demais aos estudos não
passava pela cabeça dos simples trabalhadores imigrantes, que aconselhavam seus
filhos: “basta de libri desso, che non te magni mia libri stasera” (chega de
estudar, porque hoje à noite não vais jantar livros). O missionário capuchinho
Frei Bernardin d’Apremont deixou em seus registros que:
“devido a insistência do frade,
um colono resolveu matricular os dois filhos na escola, mas fez a seguinte
proposta: pagaria apenas uma matrícula, e os filhos se alternariam, indo à
escola um dia um, e no outro dia outro. Desse modo se economizaria dinheiro, os
dois aprenderiam a ler e escrever e a contar, e um deles estaria sempre em casa
para auxiliar na plantação“.
Os
colonos imigrantes, mesmo não concordando com uma escola meramente teórica,
muitas foram às escolas construídas por eles ou com auxílio da igreja e das
autoridades. Os colonos conseguiam entender que a educação (o letramento) eram
necessários para a inserção de seus filhos na sociedade brasileira e para
formar um membro útil para a sua comunidade.
Nos
primórdios da imigração, a primeira edificação a ser construída era a capela,
que também funcionava como sala de aula, até que as condições financeiras dos
colonos melhorassem e o prédio da escola fosse construído nas linhas e
travessões.
As escolas geralmente
eram de um só professor, sendo escolhido para ocupar a função um membro da
comunidade que já tinha rudimentos de leitura e escrita da língua italiana,
porque eram italianos e, se possível que conhecesse algo da língua portuguesa
também, porque o Brasil era sua segunda pátria. Na maioria das escolas
públicas, o professor só falava português e não conseguia comunicar-se com os
alunos, motivo pelo qual, muitos alunos que só falavam o italiano, abandonavam
os estudos. Noutras, o curso era dada em três línguas, pois o professor usava
um manual escrito em italiano, do qual traduzia para o português, e depois para
o talian. Assim o aluno ficava sabendo que para “pioggia” os brasileiros diziam
“chuva”, que nada mais era que “la piova” no talian.
O Talian, a língua dos nonos
Os
imigrantes eram provenientes de várias províncias e cada grupo tinha seu
dialeto próprio, na realidade se tornaram italianos no Brasil, pois quando aqui
chegaram poucos conheciam a língua oficial da Itália. Na convivência entre os
imigrantes de várias procedências, e numa situação de isolamento e na falta de
escolas, se falava mais dialeto que o italiano e o português. Nesta mistura até
as autoridades brasileiras acabavam falando a mesma língua que os colonos.
A
mistura desses dialetos, mais palavras de procedência portuguesa, acabou por
criar uma língua comum (dialeto) o “talian” que na sua maior parte utilizou na
sua formação elementos do dialeto vêneto, bem como de outros dialetos falados
no norte da Itália como os do: Trentino-Alto Ádige, Friuli-Veneza Giulia,
Piemontes, Emília Romagna e Ligúria. À época, os jornais eram impressos nessa língua, também eram realizados os
cultos religiosos, os jogos e as cantorias, fazendo com que o italiano oficial
e o português perdessem força.
Essa língua, felizmente, mesmo com dificuldades, em função das restrições sofridas, principalmente, durante o Estado Novo, nos anos 1930, quando foi atingida pela campanha de nacionalização e durante a II Guerra Mundial (1939/1945), sobrevive até hoje. Trataremos desses ataques ao Talian, mais adiante, noutro percurso.
Os
fabriqueiros
Apesar
de existirem poucos registros relativos aos fabriqueiros das capelas e suas
funções, um dos documentos que tratam sobre eles é o regimento das capelas, mas
para os descendentes de imigrantes este termo não soa estranho, assim como os pais deste autor Leonildo
Rampanelli e Maria Aschidamini Rampanelli, a maioria foi, ou teve pais e avôs
fabriqueiros.
Com o passar dos anos, o
clero começa a ver com outros olhos as experiências nas capelas na região de
imigração italiana. O protagonismo leigo, que se iniciara em 1875, já durava
mais de 50 anos, a sua autonomia e a capacidade de articular o religioso e os
demais âmbitos da vida comunitária, como a educação, a festa e a economia,
começavam a causar desconforto à Igreja, como instituição. Esse protagonismo
termina com a criação do regimento das capelas em 1927, e, é a partir desse
momento que os fabriqueiros entram em cena.
O
termo “fabriqueiro” tem sua origem na Igreja como pessoa jurídica, conhecida
também como “Fábrica da Igreja”, um conselho constituído por bispos, padres e
leigos para a administração do patrimônio da Igreja. Este conselho designa uma
“comissão fabriqueira”, que era
constituída obrigatoriamente segundo o artigo 535 do código de direito
canônico, e tem sua origem no decreto nº 11.877 de 06 de julho de 1926,
reconhecido pelo Estado para gerir os bens do benefício paroquial e da fábrica
da Igreja Paroquial.
O
“fabriqueiro” é a pessoa indicada pela fábrica para administrar o patrimônio e
os rendimentos de uma paróquia católica, ou apenas de uma atividade específica
como a festa do Santo Padroeiro. Aos
fabriqueiros cabia garantir a sustentação econômica das atividades da
comunidade. A tarefa primeira era a de coordenar a construção e a manutenção da
capela, do cemitério e do salão comunitário.
Além das doações em
espécie, os fabriqueiros eram os responsáveis por associar os moradores da
linha ou travessão à capela, esta associação se dava por meio de contribuições
anuais dos sócios que era registrada e administrada pelos fabriqueiros. Quanto
às condições morais e religiosas, o regulamento dizia que: “não será
reconhecido pela cúria o fabriqueiro que não preencha os seus deveres
cristãos”.
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