terça-feira, 28 de janeiro de 2025

Família Rampanelli - Capítulo V - A fé sobe a montanha - A religiosidade dos trentinos.

 

A fé sobe a montanha - A religiosidade dos trentinos

            A Igreja era o poder político perante a classe camponesa. O guia (líder) do camponês não era o Imperador, nem o intelectual liberal: era o padre.

            Os 51 Bispos Príncipes do Trento que se sucederam no período, já haviam estruturado firmemente o Estado de Cristandade, dentro do regime feudal, que nasceu da fusão do Cristianismo primitivo com o Império Romano.

                        O Concílio de Trento (1545-1563) foi um importante evento ocorrido no período, que a cidade de Trento era um principado em um momento europeu extremamente delicado, em que o protestantismo avançava, e a Igreja Católica viu-se obrigada a tomar uma atitude. A escolha de Trento como sede do Concílio se deu em função da sua posição estratégica, e por ser território autônomo sob o comando de um príncipe-bispo, teve a intenção de iniciar uma contra reforma, que reconquistasse a fé católica nas terras protestantes do Sacro Império Romano Germânico.

                        Era necessário difundir a língua italiana em detrimento da língua alemã no trentino, muito difundida entre os religiosos,  sendo a  maioria dos bispos de origem germânica, em todo o território. O medo era do avanço do protestantismo no Tirol. Isso contribuiu para que o alemão perdesse cada vez mais espaço na região trentina. As missas passaram a ser rezadas em italiano e os sobrenomes de origem germânica foram latinizados ou italianizados. Foi onde o Papa Pio IV tomou as mais importantes decisões da igreja.

O Castelo Buonconsiglio é o maior e mais importante complexo monumental da região de Trentino Alto Adige. Desde o século XIII até o final do século XVIII foi a residência dos príncipes bispos de Trento, é composta por uma série de edifícios de diferentes períodos, fechados dentro de um muro em uma posição ligeiramente elevada em relação à cidade. O primeiro núcleo do castelo (o da torre à esquerda na foto) foi construído entre 1238 e 1250. A imagem é de Claudio Clamer. Neste castelo foi realizado o Concílio de Trento que durou dezoito anos (1545-1563). Fonte: https://www.cultura.trentino.it/eng/Events/Special-stamp-cancellation.

            Durante o século XVIII, missionários jesuítas influenciaram profundamente os  hábitos e costumes da população tirolesa, difundindo a devoção ao sagrado coração de Jesus e consagrando toda a região tirolesa e dos principados episcopais em “Terra Santa do Tirol”.

                        Dentro da cultura da região do Trentino, uma das características mais fortes era a presença da fé e da grande religiosidade. Os tiroleses eram católicos fervorosos. Em todos os locais próximos às vilas e nas montanhas existiam oratórios para orações. Todos participavam das missas e procissões dominicais.

Croz delle Agole – Grande Crucifixo de Madeira. Lisignano/Cembra/Trentino-Itália. Altitude 1.092 m. Obra: Escultor Silvano Ferretti.  Fonte: https://commons.wikimedia.org/wiki

                        Em vários momentos na história os tiroleses demonstraram a sua fé religiosa, e, em sua defesa revoltaram-se, um desses momentos seu deu com a chegada ao poder do Imperador Joseph II do Império Romano Germânico e Arquiduque de Áustria (1765-1790) que sancionou diversas leis que intervieram diretamente nas práticas das pacatas vilas do Tirol.

             Essas mudanças não foram muito bem aceitas, pois atingiam as práticas religiosas dos tiroleses. Joseph II dissolveu conventos das ordens contemplativas, instituiu somente um seminário em Innsbruck, capital do Tirol, com professores aplicando as novas ideias. Chegou a suspender as peregrinações e procissões, que eram práticas seculares, além de determinar quantas velas podiam ser acessas nas igrejas, quais orações podiam ser rezadas e até quantas badaladas podiam tocar os sinos das igrejas. Isso incomodou demais os tiroleses. Houve reações populares contra as reformas. As proibições das práticas foram mantidas, e os tiroleses não tomaram conhecimento da lei. Os editos imperiais afixados nos povoados e vilas foram arrancados e os padres, em seus sermões, maldiziam e evocavam a cólera dos céus sobre o imperador.
Fonte: Wikipedia. Imagem de domínio público.

 

                    O Rei bávaro Maximiliano Eu Joseph imbuído de ideias liberais, inspiradas nos princípios da Revolução Francesa (inspiração iluminista), o que o deixou mal visto e não aceito pelos tiroleses, pois o julgavam anticlerical (contra o clero). O governo bávaro inspirado nas novas ideias vigentes do livre pensamento do século XVII, proibiu a missa do galo, as cerimônias  religiosas noturnas, a benção do santíssimo depois da missa cantada. Interditou  as rogações, as novenas, a via sacra, as procissões, que provocaram insurreições no Tirol no ano de 1809.

           Os tiroleses, fortemente apegados ao clero e à coroa austríaca, reagiram ao domínio franco-bávaro, reuniam-se secretamente para encontrar uma maneira de salvar o catolicismo na região. A ânsia por uma liberdade que não coincidia com a dos liberais seguidores da Revolução Francesa, cantavam: “liberté, égalité, fraternité, vocês a cavalo e nós a pé”.

Fonte: Wikipedia. Imagem de domínio público.


            Em 1805 Napoleão foi proclamado Rei da Itália. A Áustria nesse mesmo ano se juntou à aliança com a Rússia e o Reino Unido para combater os franceses e partiu para a ofensiva invadindo a Baviera. Napoleão Bonaparte move seu exército, que estava estacionado na cidade de Bolonha na Itália, para enfrentar os austríacos na Baviera. Depois de vencer várias batalhas contra os exércitos austríacos, os franceses derrotam as forças austro-russas na Batalha de Austerlitz na Morávia em 02 de dezembro de 1805.

                Derrotada a Áustria abandona a coalização e busca a paz com França, provocando a abdicação ao trono do Imperador Francisco I e a dissolução do Sacro Império Romano Germânico, comandado pela Casa da Áustria, uma monarquia feudal que durou 800 anos. Em 26 de dezembro de 1805 foi firmado o Tratado de Pressburg que forçou os austríacos a ceder a região do Vêneto para o Reino da Itália, governado por Napoleão, e o Tirol, inclusive o trentino, para a Baviera que era aliada à França. A região tirolesa passa a se chamar de Baviera do Sul.

                       A situação já estava um caos na região tirolesa, Napoleão decide unir-se em matrimônio com a princesa austríaca Maria Luisa de Áustria, irmã da arquiduquesa Maria Leopoldina de Áustria e princesa do Brasil,  casada com Dom Pedro I do Brasil, mãe de Dom Pedro II do Brasil,  com a intenção de estabelecer uma paz definitiva entre França e Áustria, ampliando seus domínios na esfera da Casa de Habsburgo, como já era casado com Josefina encontrou forte resistência papal. Em 1809, apesar da contrariedade do Papa Pio VII o casamento foi realizado.

            Napoleão resolve ordenar a prisão do Papa, que o excomungou imediatamente. A notícia da excomunhão de Napoleão havia se espalhado pela Europa e no Tirol gerou um ferrenho ódio popular contra a ocupação francesa. A decisão papal chegou como um chamado à resistência. O clero local reforçou na população o antigo sentimento de que a nação austríaca, na qualidade de herdeira do legado histórico do Sacro Império, era também defensora legitima da fé católica, mas foi no conservador Tirol que uma rebelião tomaria proporções maiores.                                                                                                                                                                                                                                                                           Fonte: Wikipedia

            Para piorar os ânimos dos tiroleses, também houve, por parte da Baviera, o recrutamento de soldados locais do Tirol para compor o exército bávaro. Isso não foi bem recebido no local, pois a Baviera pretendia usar o exército para lutar contra a Áustria. Os homens convocados fugiam para as montanhas e não se apresentavam. Em diversos vales formaram-se grupos de resistência, considerados criminosos pela administração franco-bávara e perseguidos. Tem início então as revoltas. De todas as vilas alpinas se apresentavam homens para lutar por Deus, pelo Imperador da Áustria e pelo Tirol.


No próximo capítulo: O Vater Hofer ou Capitàn Barbón - O herói do Tirol

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