quarta-feira, 5 de fevereiro de 2025

Família Rampanelli - Capítulo XII - Parte 2 - A vida da família Rampanelli em Cembra no Tirol Italiano - Século XIX - A miséria, a fome e às doenças

 

A miséria, a fome e às doenças.

            Uma outra doença que estava causando muitas mortes nessa época era a tuberculose que atingia índices de 10% da população. Como era considerada uma doença vergonhosa os médicos evitavam de fazer relatos, referindo-se a outras causas. As vitimas eram principalmente os jovens entre 18 e 35 anos.

            Mais uma doença vitimizava os vales do Trentino na época da grande emigração: a pelagra. As causas dessa doença não eram conhecidas, mas segundo estudos realizados por um médico de Rovereto/Àustria ela teve três estágios de desenvolvimento:

            “No início, o paciente viu sua pele descamar e secar em certas partes do corpo expostas ao sol, cotovelhos e joelhos. Como resultado, isso enfraqueceu o paciente e  dificultou o trabalho. Na última fase, a pelagra levou à atrofia muscular, tuberculose pulmonar e, em muitos casos, até a loucura e suicídio. Somente mais tarde médicos e pesquisadores descobriram que a pelagra é causada por uma deficiência de vitamina”.


         Naquele período a pelagra vitimizou 60 mil pessoas na Lombardia e 40 mil pessoas no Veneto. Não havia estatísticas para o Trentino, mas estudos apontaram que 5% dos mortos em Rovereto eram devidos a pelagra e que a doença também era responsável por 20% das doenças mentais. Na comuna de Terragnolo, próxima de Rovereto, em 1896 a doença atingiu 27% da população.

 


Fonte: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Pellagra_NIH.jpg


                        Segundo De Boni e Costa:

“a dieta alimentar da população rural deteriorou-se. A carne desapareceu das mesas, sobrando aos pobres a perspectiva de matar alguns passarinhos para completar o regime alimentar. Aumentava entretanto o consumo de produtos a base de milho, principalmente de polenta. A subnutrição trazia consigo a predisposição para inúmeras doenças [...] A pelagra, uma forma de avitaminose devido ao consumo quase exclusivo de milho, grassava assustadoramente o norte do país (DE BONI; COSTA,1984, p.52-53: apud UKOSKI, 2013).

                        O imigrante Francisco Zanotelli que veio para a Colônia Conde D’Eu, hoje Garibaldi, provavelmente no mesmo vapor da família de Giuseppe Rampanelli em 1875, perdeu cinco dos seus seis filhos e resolveu emigrar com o único filho que lhe restava, Narciso Zanotelli. A causa mortis dos filhos não sabemos, mas é provável que se vincule a “pelagra”. (Zanotelli,  p. 144).

                        Estas não foram as únicas doenças que aflingiram o Tirol italiano. Muitas crianças morriam de escarlatina, doença infectocontagiosa aguda, provocada pela bactéria estreptococo que acomete principalmente crianças em idade escolar (de 2 a 10 anos). A difteria,  o sarampo e o cólera também fizeram os seus estragos. Em todas as idades houve disseminação de escrofulose, uma tuberculose dos gânglios linfáticos, doença que  se manifesta pela formação de tumores duros e dolorosos nos glânglios linfáticos, principalmente nos que se localizam no queixo, pescoço, axilas e virilhas, devido a presença do Bacilo de Koch fora dos pulmões. Os abcessos podem abrir e libertar uma secreção amarela ou incolor .

                        Também eram atingidos pelo raquitismo, que criava deformações dos ossos em todas as partes do corpo. Um médico da época escreveu que: “entre nós,os deformados florescem como cogumelos”. Essa enfermidade também era causada pela má nutrição. Vivia-se nuito mal no trentino na segunda metade dos anos 1800. Em cada cem crianças, morriam 23 antes do primeiro ano  de vida e 43 morriam antes dos vinte anos. E  a expectativa de vida era entre 36 e 37 anos no Trentino, enquanto na Alemanha, na França e nos países escandinavos era entre 43 e 50 anos.

                        As práticas sanitárias não eram bem conhecidas e pela falta dessas práticas e de  instrumentos médicos os camponeses trentinos buscavam a sua cura na natureza, através do uso de ervas e também nas práticas chamadas de “tiraossi” (extração óssea – quiropraxia primitiva) e aos “cavadenti” (extratores de dentes executados por ferreiros) e daqueles que tratavam a doença com práticas religiosas mágicas.

        
                        Havia outra causa para a difusão das doenças que devastaram a população, eram ligadas ao tipo de habitação em que vivia a classe camponesa trentina, mas também às classes urbanas mais pobres. Os ambientes eram pouco aquecidos, em uma terra com invernos longos e rigorosos, moravam em pequenos cômodos pouco ventilados.

As casas eram justapostas e não permitiam a entrada de sol e junto a casa ficavam os estábulos, local que permaneciam por muitas horas, todos os dias, especialmente no inverno, ali reuniam-se frequentemente para os filos.

            Os caminhos estavam sempre repletos de água que corria e levava consigo lixo e resíduos. O esterco das vacas eram usados para fertilizar os campos e ficavam acumulados próximos aos lares.

O povo Trentino, principalmente os pequenos agricultores se alimentavam muito mal na última parte do século XIX onde a quantidade de alimentos foi bastante reduzida. A base de sua alimentação era a polenta, poucos vegetais, leite e queijo. A carne estava quase totalmente ausente, assim como o pão. A polenta que hoje é um símbolo do folclore do Trentino, naquela época foi considerada uma condenação.

                        A miséria grassava no Trentino dos anos 1800. A nutrição insuficiente era uma doença generalizada, juntamente com isso, o modo de vida exigia esforços físicos exagerados  no trabalho, principalmente para o agricultor que possuía poucas terras, era obrigado a trabalhar muitas horas por dia para produzir o mínimo necessário para viver e envolvia mulheres, crianças e idosos no trabalho duro. Era a única maneira de sobreviver, algo que precisava ser feito em tempos de grave crise social e econômica.

                        A miséria que levou à emigração surgiu da impossibilidade de se alimentar adequadamente e da necessidade de trabalhar cada vez mais para colocar na mesa cada vez menos e da pobreza de suas casas e das aldeias em que viviam.

                         Esse estado de miséria da população camponesa, fez com que um italiano interpelasse um ministro de Estado de seu país, em relação às razões que estavam levando à emigração em massa:

            “Que coisa entendeis por uma nação, Senhor Ministro? É a  massa dos infelizes? Plantamos e ceifamos o trigo, mas nunca provamos o pão branco. Cultivamos a videira, mas não bebemos o vinho. Criamos animais, mas não comemos a carne. Apesar disso, vós nos aconselhais a não abandonarmos  a nossa pátria? Mas é uma  pátria a terra em que não se consegue viver do próprio trabalho?”

                        No Trentino se vivia no limiar da fome. O agricultor, que era  a maioria da população, situava-se no nível mais baixo da escala social e chegavam dos outros países europeus e dos Estados Unidos notícias de um modo de vida totalmente diferente, com elevado consumo e de liberdades impensáveis no Tirol Italiano. O camponês era ofuscado pelos poucos, mas poderosos, ricos, o clero e a nobreza. Esses eram chamados pelos agricultores de “siori” os ricos. Eles criaram uma música enquanto enfrentavam o desconhecido e a emigração.

Aisiori del Tirol / noi ghe daren zapa / la zapa e anca el badil / Siori menar i boi, siore a menar el plof (aratro) / ei contadini em Mérica / a be el vin nof.

Tradução: Para os ricos do Tirol, daremos a eles a enxada, a enxada e a pá, as mulheres ricas conduzirão os bois e as mulheres ricas puxarão o arado... enquanto os fazendeiros vão para a América beber um vinho novo.

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