El
scarselin del gilé – (O bolsinho do colete)
Ao
escrever a história da família
Rampanelli, a maior dificuldade foi encontrar registros escritos dos percursos da
família no Brasil. A oralidade passada de geração para geração também está se
perdendo, pois as três primeiras gerações não se encontram mais entre nós e a
minha, a quarta geração, já está em vias de extinção, pois sessenta por cento
de seus membros já faleceram.
Foi
necessário buscar nos registros fotográficos outros elementos que nos
fornecessem pistas do agir social da família Rampanelli nas suas segundas e
terceiras gerações. O modo de vestir, as roupas e seus acessórios fazem parte
da nossa identidade e refletem o momento em que vivemos. As roupas têm a
capacidade de decifrar códigos e mensagens, que mesmo não verbalizados, estão
sendo passados adiante.
Nos
registros da família Rampanelli, que chegou ao Brasil, no ano de 1875,
proveniente da Áustria, encontramos para a profissão de Giuseppe Giacomo
Rampanelli e Angela Nicolodi (1ª geração) como contadinos (lavradores ou
agricultores). Também para os membros da 2ª geração, tanto os nascidos na
Áustria: Luigi, Pietro, Giovanni e Giuditta, bem como os nascidos em Dona Isabel,
hoje Bento Gonçalves, Carlos e Izidoro, encontramos a mesma profissão.
Em
relação a educação, Giuseppe (48 anos) e Luigi (14 anos), quando chegaram ao Brasil, em 1875, estavam na condição de alfabetizados, sabendo ler e escrever
(Censo da Colônia Dona Isabel em 1883). Essa condição se deu em função das
políticas de educação do Império Austríaco, de obrigar os filhos homens de
estudar até os 14 anos de idade. A bisavô Angela, pela condição de mulher, não
tinha o direito de ir a escola. Os demais membros não tiveram oportunidades de frequentar a
escola na Áustria, por serem crianças ainda, e, no Brasil também, por falta
absoluta de escolas, permanecendo na condição de analfabetos (censo de 1883).
José Antônio Rampanelli foi Professor e falava vários idiomas.
Observa-se nas imagens
dos irmãos Luigi e Pietro Giovanni Rampanelli (2ª geração) e de seus filhos, os
primos José Antônio e José Rampanelli (3ª geração), as indumentárias (casacos,
coletes (gilé) e gravatas), e acessórios, como: chapéus (capelli) e
guarda-chuva (ombrello), além do
conhecido relógio de bolso preso por uma corrente próxima ao peito, el
scarselin del gilé (o bolsinho do colete), elementos vistos (no destaque) em
todas as imagens. Essas roupas e acessórios, para a época, eram sinais externos,
que representavam status. Os bigodes e costeletas também eram
uma parte significativa do modismo do período.
A
Era Vitoriana
A Era Vitoriana no mundo ocidental foi um tempo de elegância e formalidade, de atenção rigorosa à etiqueta e aos valores morais. Definida como o período do reinado da Rainha Vitória da Grã-Bretanha de 1837-1901. Nesse período vestiam-se mais formalmente do que hoje. Com exceção dos trabalhadores braçais, era esperado que os homens usassem casaco, chapéu e colete, sempre que estivessem em público. Algo menos que isso era considerado inapropriado e contrário aos valores sociais. Essa maneira de vestir, no século XIX, teve influência no Brasil desta época, e, sendo moda, foi instrumento de identificação num país em processo de descolonização.
O
gilé (colete) na era Vitoriana
Um dos elementos mais básicos do
guarda-roupa do homem vitoriano era o colete. Essa peça era considerada o eixo
central do conjunto masculino, e um relógio de bolso com corrente longa era
considerado um dos acessórios masculinos mais importantes desde o século XVI,
quando foi criado pelo francês Breguet. Foi projetado para homens e mulheres,
e usados como joias, enfatizando a aristocracia da sua origem. Continua sendo
um símbolo de nobreza e beleza. Esse atributo representava o status de um
cavalheiro rico e nobre. Encontramos, até hoje, entre os homens, admiradores
deste relógio de bolso.
Il
Ombrello (o guarda-chuva)
O guarda-chuva somente virou um acessório de status masculino no século XIX. Até o final do século XVIII, o guarda-chuva era um acessório quase que exclusivamente feminino. Havia preconceito na época, pois este era considerado coisa de menina. Muito raro ver homens nas ruas utilizando um guarda-chuva, pois este era considerado um objeto que demonstrava uma baixa classe social, porque se tinha a ideia de que uma pessoa que usasse o acessório não teria condições de ter uma carruagem para transitar nos dias chuvosos. Os homens se utilizavam de pastas e jornais para se protegerem da chuva.
Por volta do ano de 1750, o escritor britânico Jonas Hanway fez do guarda-chuva seu fiel companheiro. Mesmo ridicularizado, popularizou o seu uso entre os homens que, aos poucos, passaram a vê-lo como um acessório digno de um gentleman.
Nossa pesquisa não encontrou registros de que a primeira e segunda gerações da família Rampanelli, no Brasil, tinha se destacado socialmente. Todos os documentos os classificam profissionalmente como agricultores/lavradores, um trabalho braçal, considerado pela sociedade da época como degradante. Não encontramos registros de que alguém tenha exercido alguma função no serviço público, nem como artesão, como autônomo ou profissional liberal. Esse destaque social só começa na família a partir da terceira geração.
A família Rampanelli, nas suas gerações iniciais do fim do século XIX e começo do século XX, atingiu realmente esse status ou simplesmente tudo não passou de uma produção fotográfica? Se, atingido o status social, os pais (2ª geração) influenciaram os filhos (3ª geração) ou estes influenciaram os pais, no modo formal e elegante de vestir?
Caros l eitores, tirem as suas conclusões. A minha é: Se o modo de vestir reflete o momento em que vivemos, eles viviam um bom momento; estavam bonitos e elegantes; a mensagem que nos passam é a de que estavam muito felizes.
Nota do autor: Extraído do livro: Construtores de História 8 - Famílias italianas do Brasil, de Luiz Rampanelli, EST Edições, Porto Alegre, 2024, p. 165-167.
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