sexta-feira, 31 de janeiro de 2025

Família Rampanelli - Capítulo IX - A família de Giácomo Valentino Rampanelli

                                                       A família de Giácomo Valentino Rampanelli

                                   O ponto de partida para refazer os percursos da família Rampanelli será a partir da família de meu trisavô Giácomo Valentino Rampanelli (Spormaggiore/Tirol Austríaco em 23.02.1802), apesar de nossa pesquisa genealógica ter encontrado nossos ascendentes desde 1571 até os dias de hoje, não nos foi possível dar conhecimento aos percursos de nossa família no período de 1571-1802, pois não encontramos registros históricos, além dos nascimentos, casamentos, falecimentos e do local onde viveram.

Registro de nascimento de Giacomo Valentino Rampanelli. Fonte: Diocese do Trentino/Itália.

                                   O trisavô Giacomo Valentino era filho de Giovanni Batista Girolamo Rampanelli (28.09.1767) e de Lucia Domenica Maria Theresia Zeni (28.10.1774), casou com Marianna Vezzan ou Vezzani (Sergnano/Cremona-Lombardia/Itália em 20.12.1797), filha de Christiani Vezzan (i) e de Lucia Avi.

Registro de nascimento de Marianna Vezzan (i). Fonte: Diocese do Trentino/Itália.


Sergnano/Cremona na Lombardia Italiana, local de nascimento da trisavó Marianna Vezzan. Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Sergnano

                                    A trisavó Marianna por ocasião do casamento residia em San Michelle All’Ádige (Tirol Austríaco). A união do casal se deu na comuna de Nave San Rocco, onde residia Giacomo Valentino, em 23 de Setembro de 1826.  De Giacomo Valentino até os dias de hoje, 2025, são nove gerações da família Rampanelli.

Registro de casamento de Giacomo Valentino Rampanelli e de Marianna Vezzan (i). Fonte: Diocese do Trentino/Itália

                                    Os “antenati” Giacomo e Marianna são os pais do meu bisavô Giuseppe Giacomo Rampanelli (Nave San Rocco/Tirol Austríaco em 19.11.1827), o que emigrou com sua família para o Brasil em 1875. Os trisavôs Giacomo e Marianna não emigraram para o Brasil, faleceram no Trentino (Tirol italiano) e viram sua família aumentar nas comunidades de San Michelle All’Ádige, Spormaggiore e Sporminore, locais onde nasceram seus demais filhos, Giovanni Girolamo (1829), Lucia Domenica (1832), Giovanni Battista (1835) Lucia Theresia (1839), além dos neonatos* nascidos nos anos de 1837 e 1844.


San Michelle All’Ádige - Tirol Italiano, atual Trentino, local de residência dos trisavós Giácomo Rampanelli e Marianna Vezzan. Fonte: https://www.trentino.com/en/trentino/trento-and-surroundings/san-michele-all-adige/.

*O termo neonato/neonata era a designação dos meninos e meninas que morriam no parto. Entre os anos de 1815-1923 foram registrados no Trentino Alto Adige/Áustria  34.175 (neonatos) e 21.066 (neonatas).  Encontramos dois casos no período em filhos de Giácomo Valentino Rampanelli e Marianna Vezzan. Dois irmãos do bisavô Giuseppe Giácomo Rampanelli morreram ao nascer.

                                   O casal Giácomo e Marianna viveram sua infância e juventude no período em que os franceses de Napoleão Bonaparte, rei da Itália, tinham o domínio dos reinos do norte da península italiana, entre as regiões de seu domínio encontrava-se o Tirol italiano na Áustria. 

                    Não temos registros da participação de algum membro da família Rampanelli nos combates contra Napoleão Bonaparte, mas com certeza devem ter lutado contra as tropas napoleônicas, pois o serviço militar era obrigatório a partir dos 14 anos de idade e a região invadida era onde vivia a família Rampanelli.

quinta-feira, 30 de janeiro de 2025

Família Rampanelli - Capítulo VIII - A família Rampanelli no Tiro Italiano na Áustria - 1571 - 1802

 

A Família Rampanelli  no Tirol Italiano na Áustria - 1571 – 1802

                                               Após cinco anos de pesquisa, conseguimos montar a genealogia da ascendência da família Rampanelli, partindo da geração nascida em 1571 (a geração mais antiga encontrada) até 1802, ano de nascimento de Giacomo Valentino Rampanelli, meu trisavô, pai de Giusepe Giacomo Rampanelli que emigrou com sua família para o Brasil em 1875. Estas sucessivas gerações (1571-1802) sempre habitaram a região da comuna de Spormaggiore (Maurina, Cavedago) no Tirol Italiano na Áustria, hoje pertencente a província autônoma do Trentino-Alto Ádige na Itália.

Comuna de Spormaggiore - Trento Itália - Ano de 1932. Fonte: Facebook.com. Sei di Spormaggiore se...


Comuna de Cavedago - Trentino Itália - 1950. 

Localização das comunas italianas de origens da Família Rampanelli.
Fonte:



















Família Rampanelli - Capítulo VII - O clero ultramontano

 

O clero ultramontano

                        O clero Trentino, na segunda metade do século XIX, período em que  a maioria  dos imigrantes trentinos chegaram ao Brasil, era influenciado pelo movimento ultramontano, uma doutrina política católica que pregava a volta dos valores do cristianismo primitivo e também a infalibilidade do papa, buscando em Roma a sua principal referência.  O cristianismo primitivo era comunitário, profético e dos pobres da periferia. Os ultramontanos foram os teólogos, o clero, os religiosos e o povo em geral que combatiam o galicismo dos católicos franceses que desejavam uma composição com o poder civil, isto é, aumentar a influência do Estado sobre os assuntos da Igreja e limitar o poder do Papa. Essa era a concepção do governo absolutista de Luis XIV de França que a Igreja estaria submetida ao Estado e o poder do rei asseguraria o bem estar dos súditos.

                        Em posição contrária aos gauleses, os ultramontanos reivindicavam como autoridade máxima aquela que tinha sua sede, ultra montes, além das montanhas (Alpes), o Papa em Roma. Os padres sob a orientação papal empenharam-se em afirmar as linhas doutrinárias e as diretrizes disciplinares do Concílio de Trento (1545-1563), onde o dogma do pecado original era atribuído à natureza humana, a sua fraqueza e a decadência. A redenção só seria concretizada e universalizada através do domínio da Igreja sobre os continentes para que findasse a decadência. A liberdade era a Igreja. Tudo mais era a escravidão do pecado.

                                      Duomo da cidade do Trento-Itália. https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Trento_Duomo.jpg

                        Em 1870 a sociedade Trentina permanecia uma sociedade camponesa e o centro da vida econômica continuava sendo a terra. A família era a célula econômica e social mestra de tal sociedade e a Igreja Católica, aqui entendida tanto como estrutura, enquanto conjunto de leis codificadas,  fornecia para tal sociedade opções éticas e morais, mitos e tensões iguais as que existiam na Idade Média.

A igreja católica foi para o campesinato italiano e trentino o que o Estado nacional foi para a burguesia emergente [...]  Na igreja se formavam os quadros dirigentes do campesinato, para o qual o padre era mais que um sacerdote, mas também um líder intelectual. (POSSAMAI, 2005, p.41.apud...)

                        O atual Trentino, então chamado Tirol Italiano ou Tirol Meridional continuou pertencendo ao Império Austríaco até depois da unificação italiana em 1860. A população mantinha-se fiel ao imperador e havia grande resistência anti-italiana por parte dos camponeses, enquanto entre a nobreza e os intelectuais (formados por muitos filhos e netos de italianos que haviam se transferido para terras do Império Austríaco) havia maior simpatia pela Itália.

                        Somente após a 1ª Guerra Mundial, em 1919, com o Tratado de Saint-Germain, o Trentino (Tirol Italiano) passou a fazer parte do Reino da Itália juntamente com o Tirol Meridional (Província Autônoma de Bolzano). Hoje a região é conhecida como Trentino Alto Ádige, uma região autônoma ligada não mais à Áustria, mas sim a Itália.

                        Em relação à religiosidade dos imigrantes trentinos ao se transferir para o Brasil, trouxeram consigo sua cultura, seu modo de se relacionar com o meio que o circundava: das pequenas vilas trentinas, onde a religião era cultivada intensamente. Os valores religiosos foram importantíssimos para ajudar a sublimar o meio que lhes era hostil.

quarta-feira, 29 de janeiro de 2025

Família Rampanelli - Capítulo VI - O Vater Hofer ou Capitán Barbón - O herói do Tirol

 

O Vater Hofer ou Capitàn Barbón - O herói do Tirol

            Estas medidas descontentaram profundamente a população tirolesa fortemente apegada a seus valores e tradições, via-se ameaçada pelos bávaros que tinham interesse antigo pelo Tirol. Incentivados pela nobreza (coroa austríaca) e pelo clero, principalmente os padres capuchinhos, a sublevação tirolesa de 1809 contra a invasão napoleônica  surgiu com a não aceitação do novo governo e das ideias trazidas pela ocupação franco-bávara e marcou na história como a primeira grande baixa do poderio napoleônico na Europa.

            Animados pelo sentimento que podemos chamar de patrióticos, para as milícias tirolesas seu maior significado não estava no descontentamento popular frente à invasão estrangeira. De certa forma, conviviam bem com as dominações estrangeiras.  Para os tiroleses  tratava-se de uma contra revolução, os motivos reais se baseavam na reação conservadora, enraizada no tradicionalismo católico dos tiroleses e no espírito de autonomia regional.

            A revolta contra Napoleão simbolizava uma Guerra Santa, na qual o inimigo não era somente uma ameaça estrangeira, mas assumia uma representação diabólica, contrária às leis de ordem natural e da moral cristã.

                        Os tiroleses venceram duas batalhas contra as tropas francesas e bávaras. Andreas Hofer  era membro da companhia de atiradores de Merano e logo alcançou o cargo de comandante, foi um de seus lideres e chefiou as tropas de atiradores (chefe supremo), em alemão Schutzen, em trentino Sìzzeri. Hofer inspirava confiança e segurança aos combatentes. Os rebeldes tiroleses derrotaram as tropas franco-bávaras na Batalha de Bergisel, nos arredores de Innsbruck, que ocorreu entre os dias 25 a 29 de maio de 1809, sendo nomeado um intendente austríaco para governar o Tirol.

                        Neste mesmo ano de 1809, Napoleão derrotou novamente as tropas austríacas na Batalha de Wagram e a região do Tirol mais uma vez foi cedida à Baviera que era aliada da França, que ocupou a cidade de Innsbruck, a capital do Tirol, militarmente.



                     Mais uma vez Andreas Hofer (1767-1810), que era conhecido com Vater Hofer (pai Hofer) entre os tiroleses de língua alemã e de capitàn barbón (capitão barbudo) pelos tiroleses trentinos, toma a frente. Andreas era o único filho homem de seis irmãos, ficou órfã de mãe e pai aos 7 anos de idade, foi criado por sua irmã mais velha, Anna Hofer. Era um taberneiro, nascido em San Leonardo no Tirol de língua alemã, comerciante de cavalos, uma figura carismática e singular pela grande estatura e longa barba negra, líder popular e extremamente religioso. Andreas conhecia muito bem o Tirol e sua população. Falava o alemão e o italiano, pois tinha morado na região trentina durante a sua juventude e, assim conseguiu reunir para a resistência popular os camponeses de todos os vales tiroleses, destes 18 mil voluntários eram trentinos, entre eles outra grande heroína da resistência tirolesa, foi a trentina Giuseppina Negrelli, nascida na região de Primiero perto de Cembra.

Andreas Hoffer e os Schutzen (atiradores). De Franz Defregger - Tiroler Landesmuseum Ferdinandeum, Public Domain. Imagem: commons.vikimédia.

                        O governo de Viena estava nas mãos de Napoleão, mas com o apoio do clero e o auxílio do irmão do Imperador, o arquiduque da Áustria Johann Von Habsburg (1782-1859), que inicialmente apoiou os tiroleses com auxílio financeiro e militar, venceram várias batalhas em 1809. Com a vitória sobre as tropas franco-bávaras nas Batalhas de Bergisel os tiroleses retomaram a capital Innsbruck do domínio bávaro e expulsaram as tropas napoleônicas. Tombaram nessas batalhas mais de 4 mil voluntários trentinos.

                        Andreas Hofer se declara comandante imperial do Tirol. Os governantes bávaros haviam fugido e o governo austríaco não tinha nomeado um governante. O novo governo provisório é de notável cunho cristão. Por apenas dois meses Hofer governou o Tirol em nome do imperador da Áustria.

                        O Imperador austríaco havia prometido que a Áustria não abandonaria o Tirol, mas em outubro de 1809 as esperanças de Hofer foram destruídas, em novo tratado entre a Áustria e a França, novamente o Tirol foi cedido à Baviera. Os franceses com a ajuda da Baviera infligiram derrotas sucessivas ao povo tirolês e estes entregaram as armas e se renderam em novembro de 1809, após a promessa de anistia oferecida por Napoleão Bonaparte. Hofer retirou-se para o vale onde residia em San Leonardo.

                        Ao perceber a traição do Imperador austríaco, Hofer ficou transtornado e arquitetou uma reação contra as tropas franco-bávaras. Liderou a batalha final em Bergisel, onde os tiroleses foram massacrados e se renderam.

Cenas da Batalha de Bergisel/Innsbruck no Tirol em 1809 contra os exércitos franco-bávaros. Imagem: Museu  Das Tirol  Panorama.

                        Andreas Hofer escondeu-se nas montanhas do Tirol. Os franceses ofereceram uma recompensa de 1.500 florins pela sua captura. Em seu esconderijo, nas montanhas alpinas fazia orações, meditava e ofereceu seu sofrimento pela salvação de sua alma e pela dor dos que morreram pelo Tirol.

                        Andreas Hofer, sem apoio de Viena, foi traído por seu vizinho e companheiro de ideais, Franz Raffl, pelo valor da recompensa, que revelou seu esconderijo aos franceses. Hofer foi capturado por tropas francesas em 28 de janeiro de 1810 e foi enviado prisioneiro para Mântua (Mantova) na Itália para ser julgado e depois foi executado por um pelotão de fuzilamento no dia 20 de fevereiro de 1810, por ordem de Napoleão Bonaparte que teria dito: “que era para dar-lhe um julgamento justo e depois matá-lo”.

                        O dia 20 de fevereiro, dia da morte de Andreas Hofer, é particularmente especial em toda a região do Tirol, nesta data comemora-se a figura do importante personagem que colaborou para mudar o curso da história europeia e mundial nos séculos XIX e XX.

                        Como consequência da derrota dos tiroleses, a porção norte do Tirol retornou ao domínio bávaro e a parte sul (o trentino) foi entregue ao Reino da Itália de Napoleão Bonaparte. Esse período marcou o início da disputa italiana pela região tirolesa, sobretudo na área trentina.

            Em 1810 o Tirol Meridional, assim chamado pelas autoridades que dominavam o Trentino, passou ao controle do Reino Francês, um domínio pessoal do próprio Napoleão.

            Com a derrota de Napoleão na Batalha de Waterloo (1815), os países vencedores, numa decisão do Congresso de Viena em 07/04/1815, resolvem restabelecer o antigo regime desmontado por Napoleão, determinando que a região do Tirol, abrangendo o Trentino retorne ao Império Austríaco.

                        Em 1816 os Principados Episcopais do Tirol, Trento e Bressanonne  passam das mãos do clero para as mãos dos políticos leigos e são chamados respectivamente de Tirol Setentrional (de fala alemã) e Tirol Meridional (de fala italiana), permanecendo assim por mais de um século.

terça-feira, 28 de janeiro de 2025

Família Rampanelli - Capítulo V - A fé sobe a montanha - A religiosidade dos trentinos.

 

A fé sobe a montanha - A religiosidade dos trentinos

            A Igreja era o poder político perante a classe camponesa. O guia (líder) do camponês não era o Imperador, nem o intelectual liberal: era o padre.

            Os 51 Bispos Príncipes do Trento que se sucederam no período, já haviam estruturado firmemente o Estado de Cristandade, dentro do regime feudal, que nasceu da fusão do Cristianismo primitivo com o Império Romano.

                        O Concílio de Trento (1545-1563) foi um importante evento ocorrido no período, que a cidade de Trento era um principado em um momento europeu extremamente delicado, em que o protestantismo avançava, e a Igreja Católica viu-se obrigada a tomar uma atitude. A escolha de Trento como sede do Concílio se deu em função da sua posição estratégica, e por ser território autônomo sob o comando de um príncipe-bispo, teve a intenção de iniciar uma contra reforma, que reconquistasse a fé católica nas terras protestantes do Sacro Império Romano Germânico.

                        Era necessário difundir a língua italiana em detrimento da língua alemã no trentino, muito difundida entre os religiosos,  sendo a  maioria dos bispos de origem germânica, em todo o território. O medo era do avanço do protestantismo no Tirol. Isso contribuiu para que o alemão perdesse cada vez mais espaço na região trentina. As missas passaram a ser rezadas em italiano e os sobrenomes de origem germânica foram latinizados ou italianizados. Foi onde o Papa Pio IV tomou as mais importantes decisões da igreja.

O Castelo Buonconsiglio é o maior e mais importante complexo monumental da região de Trentino Alto Adige. Desde o século XIII até o final do século XVIII foi a residência dos príncipes bispos de Trento, é composta por uma série de edifícios de diferentes períodos, fechados dentro de um muro em uma posição ligeiramente elevada em relação à cidade. O primeiro núcleo do castelo (o da torre à esquerda na foto) foi construído entre 1238 e 1250. A imagem é de Claudio Clamer. Neste castelo foi realizado o Concílio de Trento que durou dezoito anos (1545-1563). Fonte: https://www.cultura.trentino.it/eng/Events/Special-stamp-cancellation.

            Durante o século XVIII, missionários jesuítas influenciaram profundamente os  hábitos e costumes da população tirolesa, difundindo a devoção ao sagrado coração de Jesus e consagrando toda a região tirolesa e dos principados episcopais em “Terra Santa do Tirol”.

                        Dentro da cultura da região do Trentino, uma das características mais fortes era a presença da fé e da grande religiosidade. Os tiroleses eram católicos fervorosos. Em todos os locais próximos às vilas e nas montanhas existiam oratórios para orações. Todos participavam das missas e procissões dominicais.

Croz delle Agole – Grande Crucifixo de Madeira. Lisignano/Cembra/Trentino-Itália. Altitude 1.092 m. Obra: Escultor Silvano Ferretti.  Fonte: https://commons.wikimedia.org/wiki

                        Em vários momentos na história os tiroleses demonstraram a sua fé religiosa, e, em sua defesa revoltaram-se, um desses momentos seu deu com a chegada ao poder do Imperador Joseph II do Império Romano Germânico e Arquiduque de Áustria (1765-1790) que sancionou diversas leis que intervieram diretamente nas práticas das pacatas vilas do Tirol.

             Essas mudanças não foram muito bem aceitas, pois atingiam as práticas religiosas dos tiroleses. Joseph II dissolveu conventos das ordens contemplativas, instituiu somente um seminário em Innsbruck, capital do Tirol, com professores aplicando as novas ideias. Chegou a suspender as peregrinações e procissões, que eram práticas seculares, além de determinar quantas velas podiam ser acessas nas igrejas, quais orações podiam ser rezadas e até quantas badaladas podiam tocar os sinos das igrejas. Isso incomodou demais os tiroleses. Houve reações populares contra as reformas. As proibições das práticas foram mantidas, e os tiroleses não tomaram conhecimento da lei. Os editos imperiais afixados nos povoados e vilas foram arrancados e os padres, em seus sermões, maldiziam e evocavam a cólera dos céus sobre o imperador.
Fonte: Wikipedia. Imagem de domínio público.

 

                    O Rei bávaro Maximiliano Eu Joseph imbuído de ideias liberais, inspiradas nos princípios da Revolução Francesa (inspiração iluminista), o que o deixou mal visto e não aceito pelos tiroleses, pois o julgavam anticlerical (contra o clero). O governo bávaro inspirado nas novas ideias vigentes do livre pensamento do século XVII, proibiu a missa do galo, as cerimônias  religiosas noturnas, a benção do santíssimo depois da missa cantada. Interditou  as rogações, as novenas, a via sacra, as procissões, que provocaram insurreições no Tirol no ano de 1809.

           Os tiroleses, fortemente apegados ao clero e à coroa austríaca, reagiram ao domínio franco-bávaro, reuniam-se secretamente para encontrar uma maneira de salvar o catolicismo na região. A ânsia por uma liberdade que não coincidia com a dos liberais seguidores da Revolução Francesa, cantavam: “liberté, égalité, fraternité, vocês a cavalo e nós a pé”.

Fonte: Wikipedia. Imagem de domínio público.


            Em 1805 Napoleão foi proclamado Rei da Itália. A Áustria nesse mesmo ano se juntou à aliança com a Rússia e o Reino Unido para combater os franceses e partiu para a ofensiva invadindo a Baviera. Napoleão Bonaparte move seu exército, que estava estacionado na cidade de Bolonha na Itália, para enfrentar os austríacos na Baviera. Depois de vencer várias batalhas contra os exércitos austríacos, os franceses derrotam as forças austro-russas na Batalha de Austerlitz na Morávia em 02 de dezembro de 1805.

                Derrotada a Áustria abandona a coalização e busca a paz com França, provocando a abdicação ao trono do Imperador Francisco I e a dissolução do Sacro Império Romano Germânico, comandado pela Casa da Áustria, uma monarquia feudal que durou 800 anos. Em 26 de dezembro de 1805 foi firmado o Tratado de Pressburg que forçou os austríacos a ceder a região do Vêneto para o Reino da Itália, governado por Napoleão, e o Tirol, inclusive o trentino, para a Baviera que era aliada à França. A região tirolesa passa a se chamar de Baviera do Sul.

                       A situação já estava um caos na região tirolesa, Napoleão decide unir-se em matrimônio com a princesa austríaca Maria Luisa de Áustria, irmã da arquiduquesa Maria Leopoldina de Áustria e princesa do Brasil,  casada com Dom Pedro I do Brasil, mãe de Dom Pedro II do Brasil,  com a intenção de estabelecer uma paz definitiva entre França e Áustria, ampliando seus domínios na esfera da Casa de Habsburgo, como já era casado com Josefina encontrou forte resistência papal. Em 1809, apesar da contrariedade do Papa Pio VII o casamento foi realizado.

            Napoleão resolve ordenar a prisão do Papa, que o excomungou imediatamente. A notícia da excomunhão de Napoleão havia se espalhado pela Europa e no Tirol gerou um ferrenho ódio popular contra a ocupação francesa. A decisão papal chegou como um chamado à resistência. O clero local reforçou na população o antigo sentimento de que a nação austríaca, na qualidade de herdeira do legado histórico do Sacro Império, era também defensora legitima da fé católica, mas foi no conservador Tirol que uma rebelião tomaria proporções maiores.                                                                                                                                                                                                                                                                           Fonte: Wikipedia

            Para piorar os ânimos dos tiroleses, também houve, por parte da Baviera, o recrutamento de soldados locais do Tirol para compor o exército bávaro. Isso não foi bem recebido no local, pois a Baviera pretendia usar o exército para lutar contra a Áustria. Os homens convocados fugiam para as montanhas e não se apresentavam. Em diversos vales formaram-se grupos de resistência, considerados criminosos pela administração franco-bávara e perseguidos. Tem início então as revoltas. De todas as vilas alpinas se apresentavam homens para lutar por Deus, pelo Imperador da Áustria e pelo Tirol.


No próximo capítulo: O Vater Hofer ou Capitàn Barbón - O herói do Tirol

segunda-feira, 27 de janeiro de 2025

Capítulo IV - Kaiserschutzen - Os Atiradores do Imperador

                                               Kaiserschutzen  -  Os Atiradores do Imperador

            As tropas francesas superavam as forças tirolesas de cinco para um. O que fazia a diferença nessas tropas recrutadas no improviso era a presença dos “Schutzen”, atiradores de elite (protetores) que com sua coragem, pontaria e nas lutas no corpo a corpo, conseguiram repelir as forças francesas que abandonaram as suas posições.

            Apesar de recrutadas apenas em emergências, essas companhias de milícias já atuavam no Tirol, desde a sua formação pelo Imperador Maximiliano I de Habsburgo (1459-1519) do Sacro Império Romano Germânico, no ano de 1511, quando criou o Landlibell, um conjunto de normas que permitia a organização militar, um tratado de defesa entre as províncias que faziam parte do Tirol histórico (os principados de Trento, de Bressanone e do Condado do Tirol).

             Maximiliano I foi criado na França, mas era apaixonado pela terra tirolesa, criou uma organização paramilitar voluntária e composta por camponeses, artesões, comerciantes e nobres, que eram recrutados para formarem as companhias de atiradores, se chamavam de Schutzen (alemão), Sìzzeri ou Scìzer (dialeto trentino) e Bersaglieri (italiano) em toda a região tirolesa.

             É preciso ter em mente que as características de autogoverno nos vales tiroleses sempre estiveram presentes. Uma autonomia voltada para a formação de grupos de autodefesa territoriais, fiéis ao Império, mas principalmente ligados ao seu próprio território. Por isso os Schützen nunca foram reconhecidos como verdadeiros soldados. Porque uma coisa é a defesa do Estado, outra coisa é a defesa da própria terra.

            Os atiradores se reuniam principalmente aos domingos, após a missa, para treinamento. As espingardas eram guardadas pelo padre na sacristia da igreja, demonstrando o apego dos Schutzen aos princípios religiosos da Santa Igreja Romana. Não eram recrutados para lutas fora das terras do Tirol, suas ações eram realizadas dentro das fronteiras  tirolesas. Tinham direito a armamento, alimentação e uma remuneração pagas pelas comunidades tirolesas.

            Os Schutzen defendiam os valores religiosos, Deus vinha em primeiro lugar, depois o território em que viviam, trabalhavam e produziam, viam a família como pedra fundamental, o alicerce da sociedade civil, sem, nunca reclamar da sua supremacia para com os outros povos, tentavam apenas viver em paz, defendendo a sua terra, e sua autonomia.

            Quem eram esses Schutzen (atirador em alemão), sìzzeri ou scìzeri (adaptação da pronúncia tirolesa Schitzen) ou bersaglieri (em italiano) que tanto assustaram Napoleão Bonaparte?

Eles eram atiradores de elite. A partir do século XVI (1511) até o século XX (1918) o Tirol foi sempre defendido por voluntários locais. Os Schutzen fizeram grandes estragos nas tropas napoleônicas, com muitas baixas, o que fez Napoleão emitir um manifesto, distribuído em todas as comunidades tirolesas, com sérias ameaças a quem não colaborasse com os franceses,  como a dirigida aos lideres  comunitários (prefeitos) que se encontrassem companhias de atiradores nesses locais, as vilas seriam incendiadas e seus moradores enviados para as prisões na França. Quem fosse encontrado com um rifle na mão seria imediatamente fuzilado. A história nos conta que essas ameaças não surtiram efeito nenhum entre os tiroleses, muitas comunidades, como a de Cembra em 1797, foram totalmente queimadas pelos franceses.


                                    Manisfesto de Napoleão Bonaparte para os tiroleses.  
                        Fonte: http://www.fabiovassallo.it/ita/valdicembra/battaglia.html

            Mesmo assim eles não se deixavam intimidar, existiam canções que recordavam os feitos tiroleses de 1796: “Tirolesi, Tirolesi venite all'armiecco i francesi ... Tiroleses para as armas ... os franceses estão chegando.

            No século XVIII, os Schutzen utilizavam um rifle, o Stutzen, uma arma curta com cano estriado, dotado de uma precisão incrível. No Império Austro-Húngaro, eles foram chamados de Kaiserschutzen, os atiradores do Imperador. As vitórias dos patriotas tiroleses liderados por Andreas Hofer contra Napoleão Bonaparte em Bergisel (Áustria) em 1809 teve impacto especial na consciência do povo trentino, tanto que Segonzano, uma comuna ao lado de Cembra, foi chamada de Bergisel Von Welschtirol (Bergisel do Tirol Italiano), ou seja, Trentino.

            Em tempos de paz os Schutzen praticavam o esporte de tiro ao alvo, realizavam atividades de proteção civil e de bombeiros.  Hoje, no Trentino existem muitos grupos de Schutzen que participam de eventos da província com seus trajes tradicionais e rotinas de marcha.

As batalhas dos tiroleses x franceses pela retomada de Trento.

             Após quatro dias de combate as forças tirolesas comandadas por Felice Von Riccabona entraram triunfalmente na cidade de Trento forçando a retirada dos franceses da cidade. Na batalha final de 6  e 7 de novembro de 1796, o comandante Schutzen Riccabona  conquistou Castel Pietra, obrigando desta vez a retirada dos franceses de todo o Trentino.

                                      Castel Pietra (Castelo de pedra) em Calliano – Trentino/Itália. Localizado entre as cidades de Trento e Rovereto. Imagem:   https://www.tripadvisor.com.mx/Attraction_Review-g2357775-d7059333-Reviews-Castel_Pietra-Calliano_    



sábado, 25 de janeiro de 2025

Capítulo III - (Re) fazendo o percurso de Giuseppe Giacomo Rampanelli

 

(Re) fazendo o percurso de Giuseppe Giácomo Rampanelli

                        Este percurso na história inicia-se no final do século XIX, na região do Tirol Italiano na Áustria e se estende até os dias de hoje, no início do século XXI. Será contado ao (re) fazer os percursos de Giuseppe Giácomo Rampanelli e Ângela Nicolodi e de seus descendentes, desde a saída da Áustria, sua chegada ao Brasil e no Rio Grande do Sul, bem como da mobilidade espacial e temporal de seus descendentes, na qual este autor se insere. Estaremos assim, ao mesmo tempo resgatando no processo histórico o percurso dos imigrantes tiroleses e italianos e sua adaptação ao novo país, o Brasil. Ao final destes percursos, estaremos fazendo nossa última e decisiva parada, nos recortes de espaço/tempo, finais e atuais, isto é, num novo percurso, o de retorno às origens.

            Esta história abordada na esfera da vida humana resulta em uma teia única e homogênea, rica de histórias, signos, símbolos e repleta de significados encontrados abundantemente no espaço geográfico da vida dos imigrantes austríacos e italianos e de seus descendentes. Nosso maior compromisso deve ser com a verdade histórica, aquela feita, a partir de fatos, analisados através de documentos, fotos e depoimentos.

Tirol Histórico - A Terra dos Nonos

                        Para uma melhor compreensão dos imigrantes trentinos que vieram para a América e, em especial da família Rampanelli para o Brasil, se faz necessário traçar uma  linha no tempo para sabermos um pouco da sua história e mostrar como seu deu a ocupação geográfica do território do Tirol na Áustria e a influência das diferentes culturas na formação da identidade dos tiroleses austríacos, fortemente marcada pela religiosidade.

Mapa atual do Trentino Alto Adige, antigo Tirol Italiano. Fonte: https://ontheworldmap.com/italy/region/trentino-alto-adige/trentino-alto-adige-physical-map.html

                         Em muitos desses palcos tiroleses, antepassados da família Rampanelli atuaram, em quais palcos e qual foi o tamanho da sua atuação deixo para a imaginação dos leitores, com a certeza de que todos eles merecem os nossos aplausos, independente da sua atuação.

            A região do Tirol já recebe seus primeiros assentamentos no seu período pré-histórico, datados de 7.800 a.C. As primeiras comunidades estáveis acontecem em 4.000 a.C.

            Esta região esteve sob o domínio de diferentes povos e de várias culturas, entre eles os pré-romanos como os venezianos, etruscos e gauleses, depois vieram os romanos, germânicos, lombardos, francos e celtas.

             Por volta do ano 40 a.C. a região  do Trentino era a porta de entrada no Império Romano e era de fundamental importância para este. Sob a órbita de Roma, deu-se início o desenvolvimento de cidades com toda infraestrutura romana, como termas, fórum, etc. A cidade (hoje em dia Trento) foi chamada pelos romanos de Tridentum, a cidade dos três dentes, talvez por haver três colinas próximas à cidade que se assemelham a três dentes. Outra teoria afirma ter sido uma homenagem dos romanos a Netuno, o mitológico Deus dos mares que empunha um cetro com três dentes.

Mapa da cidade murada de Trento (antiga cidade romana de Tridentum) de 1640. https://creativecommons.org/share-your-work/licensing-considerations/compatible-licenses/

            Inicialmente era um acampamento militar romano (Castrum), depois passou a ser chamada pelo Imperador Romano Claudis em 46 d.C., como “Splendidum Municipium”. Tridentum como todas as cidades romanas tinha uma planta quadrangular, limitado de um lado pelo Rio Ádige, dos outros três lados por muros e fossos, com torres quadrangulares e portões de acesso, dos quais o principal foi a Porta Veronensis.  Também foi um importante entroncamento rodoviário onde se destacava a via Claudia Augusta, a principal via militar ao norte. A antiga cidade romana de Tridentum foi descoberta e vive hoje no subsolo do centro histórico da cidade do Trento. Portanto é possível fazer uma visita aos vestígios de uma Roma antiga e conhecer a história de uma antiga cidade sepultada.

            A partir do século III d.C., começaram a ocorrer invasões de povos germânicos no território romano, com a incursão de diversos guerreiros, entre eles Átila, no território trentino em 451 d.C.

            O Cristianismo já estava estruturado no Trentino em meados do século IV, seu terceiro Bispo foi San Vigílio que foi martirizado no ano 400 d.C.

            Em 476 d.C., com a invasão dos bárbaros caiu o Império Romano.

            No período de (493-526) sob o comando de Teodorico a região teve um período de relativa paz.

            A partir de 800 d.C., Carlos Magno, o rei dos francos, é coroado Imperador pelo Papa, e surge assim, o Sacro Império Romano Germânico, do qual a região trentina passa a fazer parte. A região trentina passou a ser um importante território dentro do novo Império, devido a sua posição estratégica entre o norte alemão e o sul italiano e caminho obrigatório para os germânicos chegarem a Roma, fato este que gerou o interesse dos reis em garantir a paz na região. Para governá-la foi instituído o cargo de príncipe-bispo que consistia na escolha de uma pessoa, por um conselho especial da Catedral em Trento, para ser nomeada governante, que recebia o poder temporal do Imperador e o poder religioso do Papa. Dessa forma o governo era leal a ambas as partes.

                        No ano de 900 d.C., Oto I da Alemanha concede aos bispos trentinos vastos territórios na região, inclusive Cembra.

                        Em 1027, Conrado II, voltando de Roma, confere o feudo trentino, assim como Bolzano ao bispo de Trento Udalrico II.  A partir de então o bispo de Trento passou a contar com enormes poderes sobre o território: era feudatário direto das terras, e só respondia ao Imperador.

                         A partir de 1200, os condes do Tirol foram se encarregando do controle militar da região trentina. Sua força era muito grande, e de seu castelo, em Merano, passaram a dominar a região que corresponde hoje ao Trentino – Alto Àdige até o Estado do Tirol, na Áustria. Assim nasce o Tirol em 1248 e leva o mesmo nome do castelo dos condes, enfim o Condado do Tirol, unido a duas dioceses episcopais, a de Trento e de Bressanone.

Castelo do Tirol – Residência dos Condes do Tirol, responsáveis militares pelo Condado do Tirol e protetores dos Episcopados de Trento e Bressanone.  O castelo está localizado na cidade de Merano  próxima de Bolzano, na região de Trentino – Alto Ádige. Fonte: Dreamstime, foto de estoque isenta de royalties.

            Assim até meados dos anos 1800 o Principado de Trento é um pequeno Estado dependente do Imperador. O Bispo tem direito de assento e voto nas questões do Império, têm o comando militar e soberania absoluta sobre os vassalos.

            Portanto do final do século XI (1.100) até o início do século XIX (1802) a região do Trentino foi um Principado Episcopal, administrado exclusivamente pelo clero.  O Bispo de Trento era o senhor (proprietário) e chefe político da região, suserano, das terras, essas eram concedidas aos Condes e Barões e esses as dividiam com os camponeses que as trabalhavam como servos da gleba, dando ao senhor a maior parte da produção.

Tirol/Áustria – Napoleão Bonaparte na terra dos nonos

                        Esta região do Tirol tinha uma configuração geográfica única, onde seus habitantes viviam isolados em vales estreitos, quase inacessíveis, espremidos por altas montanhas cobertas por bosques, situadas ao longo da bacia do rio Ádige.

Região do Trentino na bacia do Rio Ádige (centro da foto) onde viveram nossos antenati e ainda vivem muitos Rampanelli na Itália.          Cembra      San Michelle, Nave San Rocco.          Trento.          Rovereto.      Rio Ádige.

                        


Entre os nomes da família, encontramos, ao retroagir às origens, o de meu tataravô Giacomo Rampanelli, com nascimento próximo ao ano de 1800, casado com Marianna Vezzan.   De  Giacomo até os dias de hoje, 2025, são nove gerações da família Rampanelli. Os “antenati” Giacomo e Marianna são os pais do meu bisavô Giuseppe Giacomo Rampanelli o que emigrou com sua família para o Brasil em 1875. Os tataravós Giacomo e Marianna não emigraram para o Brasil.

                        Giácomo e Mariana nasceram no Trentino (Tirol italiano)  e viram sua família aumentar nas comunidades de San Michelle, Nave San Rocco, Spormaggiore e Sporminore, locais onde nasceram seus filhos. Viveram sua infância no período em que os franceses de Napoleão Bonaparte tinham o domínio dos reinos do norte da península italiana, entre as regiões de seu domínio encontrava-se o Tirol italiano na Áustria. O autor  Benvenutti em sua obra “In Storia Di Cembra” nos relata que:

“Em 20 de março de 1797 os franceses de Napoleão Bonaparte alojam-se em Cembra, fazem da Igreja seu quartel e consomem quase todos os víveres da pequena cidade, causando por incêndio e destruição o aniquilamento de muitas casas e bosques” (BENVENUTTI, 1994, p. 264, apud ZANOTELLI, 2011, p.)

            No final do século XVIII, toda a região trentina, onde se inclui Cembra, passa a sofrer, assim como o resto da Europa, com o poderio militar de Napoleão Bonaparte (1769-1821), que pretendia estender sua influência sobre toda a Europa.

            No outono de 1796 as tropas francesas haviam conquistado o território do norte da Itália. Neste mesmo ano ocorre a primeira invasão das tropas napoleônicas ao Trento, mas também Napoleão enfrentou a sua primeira grande derrota, apesar do seu exército ser considerado invencível.


Cidade murada do Trento em 1850. Antiga cidade romana de Tridentum. Fonte: https://angelinawittmann.blogspot.com/

Durante as primeiras tentativas de ocupação francesa no Tirol, atiradores tiroleses combateram as tropas invasoras nos vales e montanhas da região do principado tridentino.

                        No seu avanço rumo ao Tirol do Sul, através do Vale de Cembra, utilizando o vale do rio Avísio que era considerada uma rota mais fácil e segura do que a do pantanoso Vale D’Ádige, as tropas de Napoleão, comandadas pelo general Vaubois ataca as vilas de San Michele All’Àdige, Lisignago/Cembra e Segonzano com três colunas distintas de soldados.

Panorâmica do Vale de Cembra que foi rota de passagem das tropas francesas de Napoleão Bonaparte rumo a Viena na Áustria, local de embates com os tiroleses, como na batalha pelo Castelo de Segonzano em 1796.  Fonte: https://www.simplybetterwines.com/valle-di-cembra.html.

            Este episódio, conhecido na história como a Batalha de Segonzano, uma feroz disputa pelo Castelo de Segonzano, com as tropas de Napoleão Bonaparte. O castelo era considerado um ponto estratégico militar e foi queimado pelos franceses na sua retirada.

Castelo de Segonzano no Vale de Cembra. Palco de disputa entre tiroleses e tropas napoleônicas. Segonzano foi considerado pelos tiroleses de língua italiana como a Bergisel do Trentino. Fonte: https://www.visittrentino.info/en/guide/must-see/castles/castello-di-segonzano_md_2408.

                        O Vale de Cembra não possuía exércitos regulares, tinham apenas companhias de milícias, sem militares treinados, que eram recrutados entre os habitantes locais, a maioria de camponeses. Nessa e em outras situações de emergências havia um chamado às armas (leva in massa ou levante em massa) para que todos os homens fossem chamados para defender as fronteiras do vale.  Para muitos homens as suas armas eram apenas as ferramentas de trabalho do seu dia a dia.